ECONOMIA E REINO DE DEUS |
Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus Cúria Geral
Documento de Trabalho.
Conferência Geral.
Recife - Brasil 16-26 de maio de 2000
Muitas respostas ao questionário de preparação para a Conferência Geral de 2000 nos têm chegado, pelo que lhes somos muito gratos.
A Comissão Preparatória reuniu-se em Roma, na Cúria Geral, nos dias 20 a 24 de dezembro de 1999 para preparar o documento de trabalho.
Conhecidas as respostas e com o propósito de redigir um documento simples, não com uma feição técnica sobre o tema "Economia e Reino de Deus", dividimos nosso texto em quatro partes
A primeira contém uma apresentação muito simples da economia, hoje, e do capitalismo neo-liberal. Não levamos em consideração os aspectos técnicos da questão porque já o fizemos antes.
Na segunda parte, desenvolveu-se mais amplamente o tema do Reino de Deus. Muitos confrades observaram que o primeiro documento havia falado pouco sobre esse assunto. Acentuava-se, exclusivamente, o tema da economia. Por isto propomos, agora, um texto que responda a questão sobre a que reino de Deus nos referimos, nesta Conferência, quando falamos dele com uma referência específica à espiritualidade dehoniana, baseando-nos nos escritos do Pe. Dehon, nas Constituições e no que foi dito, por ocasião da Conferência de Brusque (1988).
Queremos ter uma visão da realidade da economia atual à luz do Reino de Deus, de seus princípios e tirar, daí, conclusões práticas; é isto que fará essa Conferência.
Na terceira parte, faremos um inventário do que já se faz nas províncias, regiões, distritos e comunidades para a uma mudança do sistema econômico neo-liberal e principalmente tendo em vista a defesa dos direitos do homem e a promoção da dignidade da pessoa. Todavia, a lista das iniciativas não está completa. Em nível de Congregação, se faz muito mais do que aquilo que se disse aqui. Nós temos, com efeito, um exemplo, uma descrição do que acontece na Congregação, neste setor de atividades
Enfim, na quarta parte, apresentamos as sugestões feitas pelas províncias, regiões e distritos em vista de opções operacionais para a próxima Conferência Geral. No curso da Conferência, outras sugestões e outras iniciativas poderão ser propostas.
Para atender às exigências da clareza, dividimos essas sugestões em quatro blocos temáticos: sugestões que dizem respeito à formação e à informação, tanto dos nossos membros como do povo; a participação nos movimentos que lutam pela defesa dos direitos do homem e pela mudança das estruturas internacionais; sugestões concernentes ao investimento de nossos fundos e à vida de pobreza. Em um bloco aparecem as sugestões feitas à assembléia mesma da Conferência Geral.
Muitas respostas ao questionário deixam transparecer que o tema desta Conferência é novo e complexo e portanto difícil para aqueles a quem o assunto não é familiar. Elas mostram, entretanto, a importância e a força estimulante do assunto. No limiar do terceiro milênio, nós, religiosos dehonianos, não podemos ficar impassíveis e indiferentes do enorme problema da miséria, da fome e da marginalização de tantos de nossos irmãos e irmãs. Uma situação como esta é gerada por estruturas injustas que regem a economia mundial. É evidente que não podemos resolver todos os problemas, de outro lado, não temos o direito de nos omitir de fazer o que podemos.
Nós lhes desejamos uma boa preparação para essa Conferência Geral e, se possível, interpelando novamente as comunidades e a província como um todo tanto para aprofundar as reflexões como para que os representantes possam levar para a Conferência o pensamento comum
A comissão preparatória
P. Peter Sanders scj
P. Ângelo Cavagna scj
P. Osnildo Carlos Klann scj
Roma, 24 de dezembro de 1999.
Na sua mensagem para o Dia Mundial da paz do ano 2000, João Paulo II dizia o seguinte: nesta perspectiva, é um dever interrogar-se também sobre o crescente mal estar para o qual muitos estudiosos e agentes econômicos chamam nossa atenção, hoje, diante dos problemas emergentes e que dizem respeito à pobreza, à paz, à ecologia, ao futuro dos jovens quando refletem sobre o papel do mercado, sobre a presença dominante do fator monetário e financeiro, sobre a separação entre o econômico e o social e sobre temas semelhantes da atividade econômica
Talvez tenha chegado o momento de uma nova e profunda reflexão sobre o sentido da economia e de suas finalidades. A este propósito, parece urgente reconsiderar o conceito mesmo de bem-estar para que não seja dominado por uma estreita perspectiva utilitarista, reservando um espaço apenas marginal e residual para valores como a solidariedade e o altruísmo" (N. 15)
Com efeito, a questão da economia é de extrema importância porque afeta distintos aspectos da vida e por isto interessa a cada habitante do planeta. Não é possível evitá-la. É como um tecido. Se alguém tira uma parte, o efeito recai sobre todo o tecido. Além disto, o problema é bastante complexo e as respostas ao questionário indicaram que muitos confrades sentiram-se com pouco preparo para discuti-lo com conhecimento de causa. Para poder estar interessado é necessário compreendê-lo, de outro modo, as intervenções que fizerem e as orientações que forem dadas poderão provocar mais danos do que benefícios
A economia está estreitamente ligada à realidade política e normalmente os dois aspectos andam juntos. Por este motivo é evidente que não se pode separar a economia dos outros aspectos da vida. Deste modo, se alguém quiser mudar a economia terá necessariamente que estar também envolvido politicamente. No empenho pela formação da opinião pública os meios de comunicação, a palavra pronunciada, a palavra escrita de que nós dispomos, são meios através dos quais podemos influenciar a economia e orientá-la para o bem de todos.
O sistema econômico que hoje domina o mundo, especialmente depois da queda do bloco comunista, é geralmente chamado capitalismo neo-liberal. Assim pode ser definido: é um sistema que, com a globalização do mercado e da produção, privilegia a livre troca de bens e serviços, para obter o maior lucro possível. Fundamenta-se em regras que são intrinsecamente perversas porque não estão a serviço das pessoas. Inevitavelmente, esse sistema favorece as grandes empresas internacionais que dominam a economia e estão situadas geralmente no hemisfério Norte.
Esse sistema econômico chama-se neo-liberal porque transcende o controle do Estado, nação ou nações em particular. Às vezes é chamado também de "economia de livre mercado". Atualmente, não há instituição que possa controlar o livre movimento de capitais, de bens e de serviços por isto o sistema pode crescer enormemente porque não existem regras ou leis que orientem ou limitem seu crescimento ou seu desenvolvimento
"Hoje está em vigor o que se chama de mundialização da economia, fenômeno que não se pode reprovar simplesmente, porque pode criar extraordinárias ocasiões de maior bem-estar. Entretanto, sente-se cada vez mais a necessidade de que, a esta internacionalização crescente da economia corresponda a existência de bons organismos internacionais de controle de orientação que possam dirigir a mesma economia para o bem comum o que nenhum Estado, mesmo o mais poderoso da terra, tem condições de fazer...Sem dúvida, há ainda muito que se fazer neste terreno". (Centesimus Annus n. 58)
Esse sistema expandiu-se muito no mundo mas já tinha suas raízes no crescimento da produção e do mercado da Idade Média. Entretanto, de lá para cá, muitas mudanças intervieram no sistema. Todavia, seria longo demais descrever toda essa história; basta indicar como ele está estreitamente ligado à história da civilização ocidental. São bem visíveis suas ligações com a filosofia do individualismo e do materialismo. Não obstante, não se pode pensar, atualmente, em eliminar o sistema; seria uma utopia. O problema está em como transformar o sistema de modo que possa ser um serviço à humanidade e não usado em detrimento dela. O princípio do lucro sobre o qual se baseia o capitalismo neo-liberal é reconhecido como princípio válido. "A Igreja reconhece a justa função do lucro como bom funcionamento da empresa" (Centesimus Annus n. 35). Todavia muitos outros princípios sobre os quais ele se baseia devem ser examinados de maneira crítica.
Este sistema econômico que temos hoje é muito imprevisível porque pode, de repente, ver-se afetado por pequenos acontecimentos aparentemente insignificantes. Vejam-se, por exemplo, a crise do petróleo dos anos setenta, a dificuldade financeira do México ou a crise asiática do ano passado. Todos estes aspectos mostram a sensibilidade do sistema e suas interconexões. Povos inteiros estão expostos a um risco contra o qual não há proteção nenhuma. Isto pode levar a uma sensação de insegurança, visto que elementos imprevisíveis podem ocasionar efeitos negativos para um grande número de pessoas
Esse sistema é também ambivalente no sentido de que tem elementos positivos e negativos. Produziu um alto nível de conforto para uma considerável parte da humanidade, a concorrência tornou possível o desfrute de muitos bens a um preço acessível e proporcionou liberdade para muitos. Não obstante, trouxe um grande sofrimento para um número maior de pessoas. As conseqüências ecológicas são graves em muitas regiões; a habitabilidade do planeta está posta em perigo para as futuras gerações; o lucro fácil com a produção de armamentos, se é vantagem para muitos, constitui uma ameaça para a paz de todo o mundo; a exportação de trabalho feita pelos países ricos para os países menos desenvolvidos pela facilidade de mão de obra de baixo custo tem condicionado uma escravidão moderna, e tudo pela fome do dinheiro. As práticas injustas do comércio dos países ricos com os países pobres continua alargando a fratura, fazendo com que os ricos fiquem mais ricos e os pobres, cada vez mais pobres A dívida internacional dos países pobres está pendente como a espada de Dámocles sobre suas cabeças, no entretanto, a corrupção dos governos oficiais não tem permitido que chegue a eles a ajuda que lhe é destinada.
É evidente, ademais, que o sistema econômico que conhecemos cria enormes desigualdades na distribuição da riqueza entre a população do planeta. Um certo número de pessoas pode usufruir de uma quantidade incrível de recursos, enquanto outros não têm sequer o necessário para uma vida humana. Isto não pode nem deve continuar assim. Se não se faz alguma coisa neste sentido, os peritos prevêem que o resultado será uma grande perda, inclusive a quebra total da sociedade. Devem-se fazer mudanças estruturais que protejam, de preferência, os mais vulneráveis. Nós, como religiosos, não podemos omitir-nos a este debate, refugiando-nos na desculpa de que se trata de assunto por demais amplo e complicado para que possamos enfrentá-lo.
A economia é hoje o maior problema da humanidade. "No início de um novo século, a pobreza de milhões de homens e mulheres é a questão que mais do que qualquer outra coisa interpela nossa consciência humana e cristã. Ela se torna mais dramática ao tomarmos consciência de que os maiores problemas econômicos do nosso tempo não dependem da falta de recursos, senão do fato de que as atuais estruturas econômicas sociais e culturais se recusam a assumir as exigências de um autêntico desenvolvimento" (Mensagem para o Ano Novo 200, n. 14).
O que se pede, antes de qualquer coisa, é uma ética da atividade econômica: - "Uma economia que não considera a dimensão ética e não se ocupa em servir ao bem da pessoa - de cada pessoa e de toda ela - não se pode chamar a si mesma de "economia", entendida no sentido de uma gestão racional e benéfica da riqueza material" (Mensagem para o Ano Novo, n.16). A proteção e o lugar central da pessoa são fortemente sublinhados pelo Evangelho e pelo ensinamento do Papa João Paulo II. Estes e outros valores presentes no Evangelho devem estar integrados no sistema econômico de modo que a economia esteja a serviço da pessoa.
Não se trata, simplesmente, de fazer alguma coisa pelos pobres e desfavorecidos mas sobretudo de comprometer as vítimas do capitalismo neo-liberal no processo de eliminação de seus defeitos devastadores e da transformação do sistema. Valorizar os recursos dos países pobres de modo que eles mesmos possam segurar e controlar seu próprio destino, ser construtores de sua própria vida e de sua própria história.
O fato de que podemos prestar atenção a uma só coisa de cada vez e de que sejamos confrontados com a realidade material pelos meios de comunicação, faz com que as dimensões mais profundas da pessoa humana, a espiritualidade, a reflexão sobre o sentido da vida sejam seriamente comprometidas. Sem embargo, podemos também contribuir, neste nível de reflexão. Devemos, antes, compreender o problema e quanto ele nos toca de perto. Assim, depois, será mais fácil comprometer-se com a tarefa da mudança da sociedade e da economia. Nós temos, na Igreja, uma longa tradição de envolvimento com os problemas atuais da sociedade. Talvez seja a Igreja a única organização do mundo que pode apresentar uma tão rica e vasta tradição neste sentido. A Congregação, desde os seus primórdios, a exemplo do Pe. Dehon, acompanhou o desenvolvimento do ensino e da ação social da Igreja. Tudo isto nos chama de novo a um compromisso. É pois, nossa missão continuar estudando esses problemas e refletindo sobre eles de forma que possamos contribuir de forma válida.
Os diversos princípios elaborados e utilizados no passado e que fazem parte do ensino social da Igreja, não deveriam ser esquecidos neste processo, especialmente os princípios da ajuda, da solidariedade, do bem comum, da dignidade da pessoa e o princípio do destino universal dos bens (Centesimus Annus, n. 15).
Isto poderia ser feito em união com o povo de Deus e com todos os homens de boa vontade. Já existem organizações no mundo que trabalham com vistas na humanização da economia. "Uma globalização da economia e da tecnologia instalou-se em todo o mundo, em razão de um crescimento fora do controle de uma política global e da ausência de uma ética global. Apesar disto vai-se desenvolvendo lentamente um sistema internacional de controle, embora se limite a introduzir apenas algumas exceções aos princípios da economia de mercado" (Hans Kung, A Global Ethic for Global Politics and Economics, p.208)
Há uma Comissão Mundial da Cultura e do Desenvolvimento, o Conselho Inter-Ação, formado por ex-presidentes e ex-primeiros ministros que elaboraram um documento "Sobre .a Busca de Normas Éticas Globais". Além disto, as ONGs (Organizações Não Governamentais) estão trabalhando em cima das estruturas e de organismos que estão engajados mais amplamente na economia.
Vêm, em seguida, movimentos locais, nacionais e internacionais que estão comprometidos com a eliminação dos efeitos nocivos da economia neo-liberal e pedem apoio e assistência. Outros exemplos dessa realidade são a Anistia Internacional, Greenpeace, grupos de pressão para eliminar o trabalho infantil, mercados de trabalho, etc
"O sistema atual não se enquadra na teoria econômica que se supõe seja seguida. Não há pessoas nem nações que possam influenciar no seu próprio comportamento, diz a sabedoria convencional. As pessoas e as nações não podem, sem embargo, recobrar sua capacidade de controlar seu próprio destino, a não ser na hipótese de ter vontade de enfrentar a complexidade apenas manobrando as alavancas que dirigem o sistema mundial ao encontro das conseqüências que ele mesmo produz" (W. Greider, One World:Ready or Not:The Manic Logic of Global Capitalism, p. 16)
Também a nós pertence o dever de trabalhar com o resto do povo de Deus, de modo que todos os povos do mundo possam viver uma vida plenamente humana. DEUS existe. Portanto, há esperança!
1. A mensagem de Jesus, segundo o Reino de Deus.
Premissa.
Antes de qualquer outra consideração, é necessário constatar que na história da Igreja a compreensão da expressão bíblica "Reino de Deus" ou "Reino dos Céus" não tem sido unívoca mas diversificada e portanto plural. Podemos dizer que há, pelo menos, três visões fundamentais.
À primeira, ao "Reino de Deus" corresponde a vida nos céus, totalmente outra, diferente da vida do mundo, aqui sobre a terra.
Na segunda, o "Reino de Deus" existe também aqui sobre a terra, porém limitado à Igreja, que se opõe ao mundo e vai à conquista do mundo.
Na terceira, a Igreja é sinal visível e sacramento, isto é, instrumento eficaz do reino de Deus que está presente e atua em toda a realidade criada, em particular, na realidade humana, para transformá-la conforme o desígnio de Deus. A Igreja, portanto, é concebida, não para a conquista e domínio, senão para o serviço, a conversão e a salvação do mundo.
Esta última é a visão atual do reino de Deus que surgiu, sobretudo, a partir do Concílio Vaticano II.
Dito isto, concentramos nossa atenção no conceito bíblico do Reino de Deus, em confronto com a realidade econômica do mundo de hoje. E veremos logo que certas realidades econômicas atuais constituem verdadeiros obstáculos para a realização do Reino.
Jesus não se apresenta como um revolucionário social, nem como reformador das estruturas da sociedade; não adere ao partido dos zelotas que sustentava a resistência revolucionária e pregava a restauração da teocracia. Todavia, entre seus discípulos havia Simão, chamado "zelota" (Lc. 6,15)
Jesus, de outro lado, não vive fora da realidade da política, do dinheiro, do poder, da pobreza, ou do trabalho. Não foge da realidade mundana como os essênios dos quais não existe o menor vestígio no Novo Testamento.
A mensagem que Jesus leva a este mundo concreto ele a expressa através da categoria do Reino de Deus ou do Céus (Mateus). Essa expressão é usada 123 vezes no Novo Testamento e muitas vezes, saída da boca de Jesus. É uma expressão fundamental para se compreender o Evangelho
O Reino de Deus pertence à história ou à escatologia? É ele uma realidade imanente ou transcendente?
O fato de Mateus preferir a expressão "Reino dos Céus" não indica necessariamente sua transcendência, senão apenas um costume rabínico de não pronunciar o nome de Deus.
No entanto, o reino é, sem nenhum dúvida, uma realidade que vai além da história; eqüivale a "vida eterna". No juízo final "o Rei dirá aos que estiverem a sua direita: vinde, benditos de meu Pai, recebei a herança do Reino, preparado para vós desde o princípio do mundo" (Mt 25,34)
Igualmente, a comparação do Reino dos Céus com a rede (Mt 13,49-50) ou a explicação da parábola do trigo e do joio (Mt 13, 40-43) ou o casamento do filho do rei (Mt 22 1-14) remetem a um reino ultramundano.
Não obstante, o Reino de Deus não é só escatologia. Ele já está presente na história inicial: "Se eu expulso demônios mediante o Espírito de Deus é sinal de que o reino de Deus chegou para vós" (Mt 12,28). Do mesmo, modo devem ser vistas as passagens seguintes: Lc 17, 20-21;18,19; Mc 10,29; Mt 13,24-31; 13,3-9.
Se o Reino de Deus indicasse apenas uma realidade transcendente, a religião cristã poderia ser considerada "ópio do povo", como dizia Karl Marx. Porém, se é uma realidade tanto histórica como escatológica, então devemos encontrar nele elementos úteis para a construção de nossa vida social, política e econômica intramundana.
Mensagem social do reino de Deus contida nas palavras e no testemunho pessoal de Jesus.
Com Jesus chegou o ano da graça do Senhor, como eram os anos sabáticos e os anos do jubileu do Antigo Testamento (Lc 4,14-21; cf Is 61,1-2; Es 23,19-11; Deut 15,1-11; Lv 25,1-55). As "Bem-aventuranças" do Sermão da Montanha (Mt 5, 1-11) são outro exemplo de como o reino de Deus tem uma dimensão terrestre e ao mesmo tempo escatológica. O mesmo se deve dizer de muitas narrações e passagens do Evangelho: Lc 7,18-30; 14,15-24; Mt 20,1-16; 18,23-35; Lc 16,19-31; Mt 25,14-36.
O Reino de Deus se traduz num "projeto de vida".
A primeira atitude requerida é o amor de Deus e do próximo (Mc 12,28-34), incluindo o amor dos inimigos e a oração pelos próprios perseguidores, o que constitui uma originalidade absoluta do ensino e do exemplo de Jesus (Mt 5,20-44). Outras atitudes são o serviço (Mt 10,41-45), a solidariedade (Mt 25,31-46), a compaixão (Lc 6,36), a generosidade (Lc 6,38), a radicalidade (Lc 5,36; 9,62).
A riqueza constitui, antes, uma dificuldade para se entrar no reino de Deus: "É mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que o rico entrar no Reino" (Lc 10,23-27). Isto pode ser entendido da seguinte maneira: é difícil que um rico venha a ser solidário, como é difícil que alguém que seja solidário, venha a ser rico. Os discípulos mais próximos de Jesus são convidados a vender tudo (Lc 10,21).
Portanto, a missão de anunciar o Reino requer uma grande modéstia e simplicidade, com ausência de todo sinal de riqueza e de poder(Mt 10,1-15; Lc 10,1-2).
Inequívoco é o exemplo pessoal de Jesus que em seu ministério preferiu os doentes (Mc 1,32-24) os famintos (Mc 6,3-14) os pecadores, com a intenção de salvá-los (Mt 9,913); Lc 19,5; 6,2;7,36-50 Jo 4,1-42;Lc 7,1-10; 8,43-48; Jo 8,1-11).
Por seu comportamento Jesus exalta o valor de toda a pessoa, sem distinção de sexo, raça nacionalidade, riqueza ou pobreza e nem sequer de conduta. Cristo quer derrubar as barreiras e discriminações que separam os homens na sociedade e reintegrar toda pessoa discriminada.
Conclusão.
O reino de Deus é uma categoria evangélica que vai muito além de uma simples ética social. O Reino é um plano de libertação concebido e posto em marcha por Deus para os homens, com um forte caráter escatológico que supera a dimensão histórica. O reino de Deus, entretanto, já está presente no mundo e deve dar uma configuração ao mundo. Esta é a missão especial dos cristãos. O reino de Deus contém uma mensagem para a vida social e para a economia.
Aqui estão, em síntese, os principais apelos evangélicos com referência ao tema:
5 Deve-se substituir a economia de marcado, puramente neo-liberal, por uma economia social, solidária e ecológica, conforme uma liberdade de mercado não selvagem porém regulamentada em função do homem
6 A função pública deve ser um serviço sem despotismo nem corrupção.
7 É necessário quebrar as barreiras entre as pessoas e as classes sociais (preconceitos, discriminações etc.) para se chegar a uma verdadeira integração social.
8 A partir do reino de Deus, deve-se tender a uma renovação radical da sociedade, segundo o espírito evangélico de verdade e de fraternidade.
9 Economia, política e cultura devem dar esperança ao homem. O reino de Deus é uma boa notícia. Na medida em que a sociedade assumir a mensagem do Reino de Deus, favorecerá a dignidade e a felicidade de todos.
Na espiritualidade do Pe. Dehon, o reino de Deus, em luta permanente, pessoal e social contra o reino de Satã, ocupa um lugar central. Na sua formação cultural, a economia e a política a ela associada eram tidas como elementos essenciais, também para o mundo eclesial. Não é por acaso que, já em idade avançada, recordava seus estudos em Roma durante os quais, ao mesmo tempo em que se dedicava ao estudo de tratados de filosofia de teologia e de direito canônico, disciplinas nas quais fez seu doutorado, além do doutorado em direito civil, ele mergulhava na leitura de tratados de economia política.
"O Reino do Coração de Jesus nas almas e nas sociedades" é o título-programa dado pelo Pe. Dehon a sua revista social e espiritual. Bastaria isto para testemunhar a importância dada pelo fundador dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus ao "Reino de Deus ou "Reino dos Céus" anunciado no Evangelho. Deve-se acrescentar aqui o título dado ao movimento de leigos associados ou agregados ao mesmo instituto: "Adveniar Regnum Tuum" (ART): que venha o teu reino.
A expressão "Reino do Coração de Jesus" serve ao Pe. Dehon para indicar ao mesmo tempo: a primazia de Deus sobre tudo e sobre todos e a centralidade do amor na mensagem do evangelho que são a base da espiritualidade do Coração de Jesus e da civilização do amor.
Fontes Dehonianas.
DIÁRIO.
Para confirmar tudo isto, será suficiente citar poucas mas decisivas frases tiradas do Diário, sem dúvida, o escrito mais pessoal e clarificador do Pe. Dehon.
DIRETÓRIO ESPIRITUAL
No diretório espiritual, talvez a obra mais espiritualista do Pe. Dehon, visto que, na realidade, se trata principalmente de um escrito da Irmã Inácia, há entretanto, duas expressões que levam a marca pessoal e única do Fundador: uma, onde ele fala do voto de pobreza, outra, onde fala do zelo. Estes são os textos:
Na ótica do "Reino do Coração de Jesus nas almas e nas sociedades", Pe. Dehon soube distinguir no meio de tanta miséria humana que existia também naquela época, o problema número um do seu tempo: a questão operária. Sempre na ótica do reino do Coração de Jesus, os dehonianos, hoje, devem fazer a mesma coisa. É isto que as Constituições inculcam explicitamente.
O n. 7 que é fundamental e que, não sem razão, é freqüentemente citado, diz-se o seguinte: "De seus religiosos, o Pe. Dehon espera que sejam profetas do amor e servidores da reconciliação dos homens e do mundo em Cristo (cf. 2Cor 5,18)".
Certamente isto implica a união com Jesus na eucaristia que é o sacramento do amor por excelência; mas isto comissiona também a reconstruir a justiça e a paz num mundo talvez nunca tão sofrido como hoje, pelos dramas da fome e das guerras.
Igualmente no n. 32, as Constituições nos incitam a perscrutar "os sinais dos tempos" de hoje para contribuir na construção do reino da justiça e da caridade cristã no mundo (cf. Souvenirs XI)". Oferecem, em seguida, as indicações para que "os Diretivos provinciais determinem, segundo os tempos e os lugares, os compromissos concretos". "No seguimento do Pe. Dehon, - lê-se ainda - temos a missão de testemunhar o amor de Cristo num mundo, à procura de uma unidade difícil e novas relações entre as pessoas e os grupos" (n. 43).
As Constituições apresentam também "o trabalho", aspecto fundamental da vida humana, como participação na "condição normal dos homens" e como expressão de "pobreza no serviço do Reino. Essa pobreza exige de nós que busquemos um estilo de vida simples e modesto" (nn. 48-49).
Acontece também que os mais comprometidos com a luta pela justiça, sobretudo quando agem contra as estruturas de pecado, como os mecanismos de opressão e de violência, sejam criticados e que venham, por vezes, a se sentir isolados e até excluídos. Referindo-se a esses, as Constituições, em outro lugar, afirmam que "nossa predileção será dispensada àqueles que têm necessidade de ser reconhecidos e acolhidos: somos todos solidários com nossos irmãos que se dedicam a seu serviço. Nós nos esforçamos, diz-se ainda, por evitar toda sorte de injustiça social. Somente assim... poderemos despertar as consciências para os dramas da miséria e para as exigências da justiça (cf. ET 17)" (n. 51).
CONFERÊNCIA GERAL DE BRUSQUE (Santa Catarina-Brasil 23/8-3/9 1988)
Parece extremamente interessante que nesta Conferência Geral a se realizar no Recife (Brasil) nos dias 16-26 de maio de 2000, sobre a "Economia e Reino de Deus" se tenha presente a conclusão a que chegou a Conferência de Brusque sobre "A Reparação Dehoniana hoje". Ela mostra o caráter essencial da dimensão social no conjunto da espiritualidade dehoniana. Estas são as palavras textuais:
"Mantendo bem claro que a inspiração reparadora deve "animar tudo que somos e tudo que fazemos" (Cst. n. 25), na Conferência Geral mantivemos, como objetivo primário de nossa reparação, o empenho pela justiça social nos contextos bem definidos dos países onde nos encontramos.
Em alguns desses países isto significará principalmente uma opção evangélica mais determinada pelos pobres. Em outros, se traduzirá, sobretudo, na preocupação de contestar as estruturas injustas de opressão e exclusão ou na luta contra um sistema de discriminação social, racial. etc
Para alcançar este objetivo que para nós é prioritário, vários meios são-nos apresentados, entre os quais são citados:
Nesta terceira parte do documento de trabalho, apresentamos uma síntese de tudo que surge das respostas ao questionário sobre o que já se faz na Congregação para formar e informar nossos religiosos e leigos sobre a doutrina, os princípios e as conseqüências do sistema neo-liberal; para promover e melhorar as condições de vida; para defender o meio ambiente; para mudar as estruturas políticas e econômicas que causam e mantêm a triste situação em que se encontram tantos irmãos nossos.
Em quase todas as partes do mundo os
nossos estão engajados na colheita de assinaturas para o perdão
da dívida externa dos países pobres.
Interessante e oportuna a decisão tomada por uma província de associar-se com os leigos para romper o monopólio de empresas que cobravam preços muito altos por seus serviços fúnebres.
Muitos irmãos lutam para mudar para melhor o mundo em que vivemos, como sacerdotes trabalhadores comprometidos com o mundo dos trabalhadores, participando em suas lutas sindicais, e tomando parte também nos projetos concretos em favor dos mais necessitados. É um modo de viver, concretamente, o "ir ao povo".
As comunidades inseridas, compartilhando com os mais necessitados, pobres, imigrantes, o ambiente, o nível de vida e as condições de trabalho, são um claro testemunho de solidariedade e de amor gratuito de Deus e um exemplo de incarnação no meio do povo.
Em muitas províncias e regiões
já se desenvolve um programa de formação e informação,
tanto em nível interno da Congregação como em nível
externo, isto é, a formação de leigos. Tudo isto acontece
graças aos meios de comunicação social (imprensa,
rádio, TV, publicações diversas, livros), às
escolas, aos cursos sobre o pensamento social da Igreja e do Pe. Dehon,
à formação do voluntariado. Assim vai-se criando uma
consciência mais clara e crítica a respeito do sistema neo-liberal
e suas conseqüências. É preciso fazer o povo tomar consciência
dos males do capitalismo e do liberalismo. Todavia não basta dar
formação apenas ao povo em geral. É importante que
os líderes políticos também recebam uma formação
e informação social. Algumas províncias já
fazem também esse trabalho.
Juntamente com a formação e a informação é preciso ter coragem de denunciar os males, como já fazem muitos dos nossos, ou pessoalmente, em conferências, discursos, cursos, homilias, ou participando de movimentos de protesto.
Na formação dos nossos jovens religiosos se inclui o ensino social da Igreja e do Fundador e tenta-se engajá-los em atividades sociais assim como despertar sua sensibilidade para esses graves problemas. A sensibilização é muito importante. Não basta conhecer os problemas e suas causas; é preciso ser sensível a esta realidade tão dura e desumana. Não faltam aqueles que, sensíveis, de modo particular, ao problema do desemprego, estão dispostos à partilha e à solidariedade. A formação contempla também este objetivo conforme o testemunho de algumas respostas ao questionário.
Em síntese, pode-se dizer que na Congregação se busca:
2 - educar para uma sensibilidade a esses problemas e promover o espírito de partilha e de solidariedade;
3 - difundir o ensino social da Igreja e do Pe. Dehon;
4 - participar de movimentos que se propõem a mudar a ordem econômica atual; melhorar as condições de vida dos mais necessitados, defender os direitos da pessoa e a ecologia;
5 - investir bem em bancos éticos;
6 - viver o voto de pobreza de um modo mais coerente, por meio de um estilo de vida pessoal e comunitário simples, modesto e austero
Nesta quarta parte do documento de trabalho, apresentamos as sugestões ou propostas obtidas a partir das respostas ao questionário, feitas em vista das opções concretas da Conferência Geral de 2000.
Algumas propostas apresentadas dirigem-se à Direção Geral, outras às províncias e regiões como protagonistas principais destes compromissos.
Para a Direção Geral.
Além disto, pede-se ao Governo Geral que desenvolva a "espiritualidade da Globalização" e estruture uma metodologia e um processo de aprofundamento dessa mesma globalização.
Uma proposta deseja que "Economia e Reino de Deus" seja matéria da formação permanente; que os membros da Congregação tenham um conhecimento mais profundo da análise social e do ensino social da Igreja, e descubram a dimensão social dos votos e de nossa espiritualidade.
Muitos insistem em que, já no período da formação inicial, se viva o desprendimento dos bens materiais, aceitando também de bom grado, a falta de muitos bens e serviços, sem dramatizar; que se viva o espírito de partilha e de solidariedade com os pobres, a dedicação ao trabalho em geral e, se for oportuno, também o trabalho manual para o auto-sustento e que se viva a gratuidade como testemunho, numa sociedade em que tudo se mede a partir do dinheiro e do lucro.
Muitos insistiram e expressaram seu desejo de que as Províncias e Regiões esforcem-se seriamente para formar e informar o povo sobre os males do capitalismo e do neo-liberalismo. Além da informação, é, sem dúvida, indispensável que se crie no povo, uma consciência clara e uma sensibilidade a esses problemas.
Deseja-se também construir "uma rede de relações para se saber o que fazem os outros institutos, a Igreja, as Igrejas evangélicas, neste terreno".
Acrescenta-se também a proposta de "estimular as províncias e as regiões para reforçar a rede de informação entre elas, para propiciar informações precisas e atualizadas sobre seus territórios para se contrapor às notícias difundidas pelos meios de comunicação"
Alguém lembrou que deveríamos informar e sensibilizar, principalmente os políticos e líderes de nossas comunidades sobre esta temática.
Diversas respostas ao questionário enviado às pessoas e às comunidades trazem propostas que se referem aos movimentos sociais, cuja importância, pelo bem e pelo mal, está fora de discussão.Com efeito, se é verdade que as idéias conduzem a história, é igualmente verdade que os movimentos fazem a história.
Entre os movimentos a se aferir no domínio econômico, foi citada a tendência ao consumo desregrado e o liberalismo. Deste modo, foi dada como sugestão uma "atitude crítica frente à tendência ao consumismo imoderado e ao movimento liberal"
Todavia, quase todos referem-se, insistentemente, aos movimentos positivos que devemos promover e apoiar, ao ponto de nos comprometermos com eles.
Alguns sugerem que se estude a fundo "o processo que gera a riqueza de alguns e a pobreza da maioria", com o propósito de se "engajarem mais concretamente com aqueles que propõem alternativas". Sugere-se, igualmente, "estudar as causas que produzem a marginalização, a exclusão" e "lutar para mudar o processo que gera a pobreza e a exploração". Outros convidam a "acreditar na força das pequenas iniciarivas a partir dos pobres."
Alguém desloca o acento, de um lado, sobre as "Igrejas locais e seus projetos de caráter social", para lhes dar "apoio"; de outro, sobre a "legislação local, nacional e internacional para "vigiar", conhecer e apoiar os movimentos de solidariedade e atuar com eles".
Outro vê a necessidade de animar o laicato cristão; mais exatamente, de estimular os líderes cristãos a assumir cargos administrativos, de apoiá-los, motivá-los, dar-lhes inspiração para o exercício de seus cargos e, se for o caso, fazer pressão sobre eles".
Há quem queria incitar a "participar" diretamente "dos movimentos de solidariedade," até "subscrevendo denúncias e protestos contra as injustiças". Proposta semelhante é a que quer preparar as pessoas e "preparar-se pelo estudo que habilita as pessoas a participar de movimentos de justiça e paz e de outros movimentos que se empenham em salvaguardar a natureza."
Há quem tenha fé nos governos para opor-se às multinacionais e propõe concretamente "pressionar os governos para que criem mecanismos que garantam a prioridade da economia de base e o clima social frente aos interesses das companhias multinacionais.".
Alguém propõe a criação de uma rede operacional, isto é, que nossa "Congregação se una a outras Congregações que se ocupam com a globalização, para encontrar recursos que possam ser compartilhados e programar ações comuns que possam ser assumidas como respostas à globalização."
Outra proposta específica, ligada à precedente: nossa Congregação "convoque um simpósio dehoniano para todos os SCJ, com a participação de homens de negócio, de profissionais, de trabalhadores, de ONGs e de organismos semelhantes, para elaborar um "projeto pastoral dehoniano" como resposta à mundialização da economia".
Outra proposição concreta: "Estudar a possibilidade de se criar, na Congregação, uma ONG, estudando os prós e os contras".
Para as Províncias, em particular, sugere-se que se criem projetos para a recuperação de pessoas (toxicômanos, portadores de AIDS...); que se colabore com grupos de ONGs, até mesmo, tornando-se membros desses mesmos grupos; dar apoio aos movimentos populares que defendem a vida, os direitos do homem, em particular, dos mais pobres (a Cruz Vermelha, movimentos para a reforma agrária, dos sem-teto); defender os direitos dos setores marginalizados pela sociedade (indígenas, as mulheres, meninos e meninas de rua); Charter 99 Global Democracy (uma corte internacional para a justiça, o desenvolvimento e a democracia); manter o apoio aos sindicatos nas reivindicações dos direitos dos trabalhadores; ficar ao lado dos homens políticos que se propõem trabalhar pela vida e pelos direitos dos camponeses e que lutam pela renovação do contexto sócio-econômico; promover a paz, fundamentada nos direitos humanos e nos deveres recíprocos das partes em conflito; exigir uma tributação e uma ordem econômica mais justas para impedir que a fratura entre ricos e pobres venha a crescer".
Acima de qualquer coisa, se deseja intervir eficazmente nas causas do mal-estar econômico e social do mundo atual, em lugar de se contentar, apenas, em aliviar seus efeitos devastadores, é preciso "defender a idéia da reforma da ONU", isto é, sua democratização e seu esforço para "resgatar a primazia da política sobre a economia"; em particular, deve-se denunciar e combater a imoralidade do "Novo Modelo de Defesa" da OTAN, centrado na defesa dos próprios "interesses vitais" onde os exércitos estão a serviço de uma política exterior de hegemonia econômica" que prejudica os países empobrecidos.
3. Sugestões com respeito à economia.
Alguns insistiram na necessidade de controlar nossos investimentos, investindo, por exemplo, nosso dinheiro em bancos éticos ou em setores que sejam úteis, isto é, construções para os pobres, cooperativas.
Alguém propõe a criação de um fundo inter-provincial que condicione, assim, uma vida concreta, na solidariedade, na benevolência e na partilha, dentro do nosso Instituto.
Uma proposta original, apresentada por um grupo, sugere que sejam perdoadas todas as dívidas à Congregação, às Províncias e às Regiões.
Muitos apontaram para a necessidade de sermos coerentes nos projetos financeiros, por exemplo, pagando salários adequados aos funcionários, segundo suas horas de trabalho. É necessário, além disto, reconsiderar certas práticas ambíguas em vista de nossa opção evangélica e rever, também, nosso neoliberalismo interno".
4. Sugestões dirigidas a essa mesma Conferência Geral.
Na redação deste documento de trabalho e ao programar a Conferêncica Geral 2000, a comissão de preparação levou em consideração muitas propostas feitas a essa mesma Conferência.
Porém, queremos destacar ainda, alguns desejos expressos no questionário, em particular, nas resposta à decima questão.
Alguém observou que os debates não "deverão limitar-se ao nível teórico; é necessário descer ao nível prático e operacional; partir da teologia (Reino de Deus, um pouco esquecido no documento preparatório) e chegar ao mundo econômico com envolvimentos concretos"
Um outro grupo assim se expressou: "Propomos que a Conferência Geral focalize sua atenção sobre duas finalidades: 1) denúncia e condenação do sistema neo-liberal; 2) uma proposta de comportamentos conseqüentes, corretos, eqüitativos, a serem postos em prática por meio de organismos adequados.
Muitos expressam seus desejos de que, "num prazo de três anos, a Conferência Geral e seu trabalho venham a ser analisados e avaliados tanto no que concerne aos meios em nível metodológico quanto à sua eficácia".
Deseja-se também que se ponha em destaque a dimensão social do pecado durante a Conferência Geral e que ela seja um "momento importante para acentuar que nossa espiritualidade e o desenvolvimento mundial da Congregação já constituem, para nós, um estímulo para nos interessarmos não só por nosso pequeno âmbito mas também pelos problemas das estruturas, em nível mundial".
Sugeriu-se também que a Conferência Geral decida que se elabore um "Catecismo social" para os nossos dias e peça que se publique uma nova encíclica sobre a dignidade da pessoa, visto que a Centesimus Annus não critica suficientemente o capitalismo neo-liberal.
O presente documento é apenas um roteiro com numerosos pontos de referência postos à reflexão, aos debates em grupos de trabalho e às reuniões em plenário. Trata-se de um instrumento que poderá ser útil para o desenvolvimento da Conferência Geral.
Pedimos que seja utilizado, juntamente com outros textos, como preparação imediata para esse evento congregacional.
O êxito dessa Conferência depende da participação séria e eficaz de cada um de nós, no espírito de serviço à Igreja, à Congregação e a toda a sociedade.