3 e 4 de Dezembro de 2001 estiveram reunidos no Seminário de Nossa Senhora de Fátima, Alfragide, Portugal, os Promotores de Justiça e Paz da Europa do Sul. Participaram o Conselheiro Geral Pe. Carlos Alberto Silva, os representantes da Itália do Norte, Pe. Ângelo Cavagna e Pe. Renzo Busana, os membros da Comissão Provincial de Justiça e Paz e Actividade Missionária da Província Portuguesa: Pe. Isildo Silva, Pe. Adérito Barbosa, Pe. Abel Maia, Pe. José Agostinho Sousa, Pe. Ricardo Basílio &endash; faltou o Diácono Luís Manuel Jesus. Estiveram também presentes durante todo o encontro os religiosos estudantes de Alfragide Luciano Vieira, Nuno Rocha e José Luís Sousa. Na manhã do primeiro dia esteve presente o Superior Provincial, Pe. José Ornelas e o Dr. Fernando Nobre, fundador e presidente da AMI.
O Superior Provincial fez a abertura do encontro, após um breve momento de oração. Lamentou a ausência dos representantes das outras Províncias que haviam sido convidado (Espanha, Itália do Sul e Polónia) e deu as boas vindas aos presentes, nomeadamente ao Dr. Fernando Nobre, que saudou pelo trabalho que tem levado a efeito à frente da sua organização, sinal evidente de transformar este mundo, tornando-o mais justo, humano e solidário.
Apresentou também os objectivos deste encontro: um olhar pela realidade presente e a forma como a nossa acção como Província e como Congregação na Europa do Sul pode ajudar a transformar para melhor essa realidade.
O Pe. Isildo fez breve apresentação do conferencista convidado. O Dr. Fernando Nobre nasceu em Angola. Formou-se em medicina na Bélgica. Destacou-se no exercício da sua especialidade médica, tendo vencido o primeiro prémio europeu de Urologia em 1984. Mas é na acção humanitária que se tem destacado. Fez parte da organização dos Médicos Sem Fronteiras e em 1984 fundou a AMI &endash; Assistência Média Internacional. Foi também fundador e vice-presidente da VOICE. Participou em mais de 200 acções humanitárias pelos Médicos Sem Fronteiras e pela AMI, em mais de 50 países.
“Experiência de Voluntariado no contexto da globalização.” &endash; Dr. Fernando Nobre
O Dr. Fernando Nobre começou por destacar as boas experiências de colaboração que tem vivido com missionários nas diferentes acções humanitárias em que tem participado um pouco por todo o mundo.
A globalização, hoje tão em voga, não é ideia de hoje, mas que atravessa todos os tempos: os Romanos quiseram fazê-la em toda a Europa; os portugueses contribuíram para ela na aventura dos Descobrimentos.
A globalização dos nossos dias tem algumas marcas significativas: grande progresso científico e técnico, comunicação global, liberdade de movimentação financeira praticamente à escala mundial. Há uma quebra significativa da influência política, predominando a força da economia. Esta transformação trouxe instabilidade. Vivemos hoje um momento de revolução presidido pela força económica.
Face a esta força da economia, é necessário que a sociedade civil se constitua em contra-poder, não para tomar o poder, mas para defender valores: os cidadãos têm obrigação de promover e defender valores.
Alguns autores falam da globalização armadilhada. Dois jornalistas alemães escreveram um livro precisamente com o nome de “globalização armadilhada” em que falam da teoria dos 20/80 que defendem alguns magnatas da economia: só 20% da mão-de-obra seria necessária para a produção; os outros 80% seriam dispensáveis e por isso “entretidos” com um salário mínimo e uma televisão que os distraísse.
O mercado foi eleito como nova ideologia. É por isso que muitos lhe chamam o deus-mercado. O Fórum económico de Davos existe há 30 anos. Mas foi necessário criar o Fórum social de Porto Alegre para que o mundo se apercebesse da necessidade de dar voz aos excluídos.
O fosso que se tem acentuado entre pobres e ricos tem sido encapotado em alguns eufemismos: antes falava-se de países subdesenvolvidos, depois passou-se a falar de países em vias de desenvolvimento e agora já se fala de países menos avançados. Só que há 30 anos eram 29 esses países e hoje são 59. Há 20 anos a África era auto-suficiente em alimentação; hoje recebe 4/5 dos seus bens de consumo. A África sub-Saariana tem hoje 800 milhões de habitantes. Daqui a 20 anos serão provavelmente o dobro, o que faz prever grandes tragédias, seja em África, seja entre nós, pelo efeito de emigrações.
Os ditadores são ou não aceites consoante aceitem ou não as regras do mercado. No Sul assiste-se a uma desgovernação e a uma corrupção desenfreadas. Assiste-se a um crescimento impressionante da pobreza. Os Estados, mesmo ditos independentes, estão totalmente dependentes, seja dos estados mais ricos, seja do FMI ou do Banco Mundial. Porque só se promovem os projectos rentáveis.
Esta situação traz graves problemas a nível da alimentação e da saúde. As grandes indústrias farmacêuticas não cuidam da investigação de remédios para as grandes doenças africanas, porque esses países não têm possibilidade de financiar as investigações.
É legítimo defender o perdão da dívida externa desses países, mas com a condição de serem congeladas as fabulosas contas bancárias que os presidentes/ditadores têm nos grandes bancos europeus e norte-americanos.
No Norte o grande efeito da globalização é a queda das ideologias: caiu-se no cinzentismo político, todos têm o mesmo discurso. Hoje quem manda é o poder económico. Os ex-ministros são hoje funcionários dos grandes grupos económicos. E este poder económico domina também o mundo da comunicação. Hoje o poder económico é um poder sem rosto, cada vez mais globalizado. As multinacionais têm orçamentos superiores a muitos estados desenvolvidos e os seus presidentes são autênticos chefes de estado. Neste contexto, as pessoas alheiam-se da vida política, como o prova o facto de a abstenção em actos eleitorais ser hoje o maior “partido” europeu. É cada vez mais importante despertar para a consciência da cidadania.
11 de Setembro. Em nome do 11 de Setembro têm sido criadas novas legislações e tudo é considerado luta contra o terrorismo. George Bush faz o discurso maniqueísta: ou é por nós ou é contra nós.
No dia 11 de Setembro estava nas ruas de Nova Iorque e, ao ver o que acontecia, perguntou-se: porquê? A resposta surgiu quase espontânea: é o ódio acumulado contra os Estados Unidos e o Ocidente. E porquê esse ódio? É o grito de revolta pelas injustiças acumuladas, o grito de povos inteiros cansados dessas injustiças.
Em todo este contexto torna-se fundamental o VOLUNTARIADO. O Voluntariado é a forma mais genuína e mais pura de afirmação da cidadania: participar. O cidadão vota, mas vota pela vontade de construir, de participar na edificação do mundo. É fundamental promover uma cidadania crítica, alerta, atenta. Esta atitude só se sustenta no Voluntariado. Os cidadãos têm que revestir-se de uma atitude activa e participativa. Hoje há muitas ONG que já se encontram demasiado dependentes do poder.
Sem participação da sociedade civil não pode haver autêntico desenvolvimento. Esse é o drama de África, em que os projectos de desenvolvimento são escolhidos mais em função do lucro dos governantes do que dos interesses dos cidadãos.
Voluntariado é a solidariedade activa, não apenas de boca. Perdeu-se muito o conceito de subsidiariedade, não responsabilizando os cidadãos nos seus deveres e competências de uma vida social activa. Vivemos em democracia. Mas nada é perene e o facto de estarmos hoje em democracia não significa que assim estejamos daqui a 20 ou 30 anos. A democracia será tanto mais perene quanto mais a sociedade civil estiver implicada. Se a sociedade civil estiver implicada e informada, mais facilmente servirá de travão a movimentos radicais de intolerância, fundamentalismo, xenofobia… É indispensável o movimento associativo. Este será o pilar que irá condicionar positivamente o evoluir da nossa sociedade. Por esses movimentos vai passar a sobrevivência das causas, dos valores.
A indiferença é um sentimento terrível. Mas a intolerância é ainda mais grave. Basta observar a história recente da Irlanda do Norte, onde vemos crianças que para ir à escola precisam de escolta policial. E como é possível continuar a fazer-se limpezas étnicas em nome de Deus?
Em todo o lado há a pirâmide do desenvolvimento. Mas quando em alguns países, nomeadamente africanos, o dia-a-dia é gasto a pensar na forma de arranjar alguma coisa para comer ou beber, não há lugar para a cidadania efectiva, a solidariedade activa ou para a cultura. A esperança média de vida em África passará nos próximos anos de 45 para 39 anos, devido à SIDA. No Botswana já passou dos 60 para os 45 anos.
Nós que não temos estas preocupações básicas de sobrevivência devemos atingir o vértice da pirâmide do desenvolvimento. E esse vértice é o outro, o serviço e o amor ao outro. O trabalho missionário é fundamental no desenvolvimento do Voluntariado e na promoção da cidadania activa e efectiva. É um trabalho que muitas vezes ajuda a governar o que actualmente é ingovernável. É fundamental agarrar as grandes causas da humanidade. A ausência de políticas gera ausência de causas. A alternativa a esta ausência de ideologias é a sociedade civil forte e activa.
Seguiu-se um tempo de diálogo, iniciado com breve apresentação dos participantes, em que cada um teve oportunidade de explicar a actividade em que se encontra empenhado.
À indiferença chamou o Pe. Cavagna de cinismo, porque é uma indiferença consciente. Comentou a ligação estreita que se constata actualmente entre o poder político e o poder económico e o apoio que estes dão ao poder militar. Com este procura-se a defesa dos interesses dos países desenvolvidos, mesmo fora do seu território, como se verifica no modelo de poder militar da NATO, que pretende defender os seus interesses mesmo fora das suas fronteiras.
Como voltar a dar o primado ao poder político, em detrimento do poder económico?
Essa transformação deverá passar, necessariamente, pela renovação da ONU, que actualmente se encontra muito dependente do poder económico e militar, nomeadamente dos EUA. O Tribunal Penal Internacional, por exemplo, só entrará em funções com a ratificação de 60 países. Até agora já o ratificaram 43. Mas os EUA não só não ratificaram como ameaçaram com retaliações a quem mais o ratificasse. É verdade que a ONU é o resultado da associação de 189 países, mas bem sabemos da dependência da maioria em relação às grandes multinacionais e aos países desenvolvidos, nomeadamente os EUA.
Debatemos as razões que levaram a ONU a propor este como o Ano Internacional do Ecoturismo. E essas têm a ver com a defesa do meio ambiente como prioridade fundamental para salvaguardar um futuro saudável e de qualidade, bem como a promoção do convívio e intercâmbio entre culturas.
Quanto ao papel que a Igreja deve desempenhar na promoção de uma sociedade mais dinâmica e activa, pareceu evidente a necessidade de a Igreja prosseguir a sua missão de interpeladora das consciências, continuando a fazer a sua opção pelos mais pobres e marginalizados, não para os calar e apaziguar, mas para os defender e promover. A mensagem cristã tem que ser interpelativa, não apenas no terreno e entre os mais pobres, mas também frente às autoridades e governos. A expansão do Islamismo se calhar deve-se também em parte a esta falta de interpelação do Cristianismo.
A reflexão levou-nos também a analisar o que se passa em relação aos países de Leste e da Ásia, em que muitas vezes são postos em causa os principais Direitos Humanos e é ofendida a dignidade da Pessoa Humana. O confronto do Islamismo com o Cristianismo pode ajudar a purificar os hábitos de uns e de outros. E é fundamental continuar a educar para a tolerância: não é possível continuar a perseguir, maltratar e matar em nome de Deus.
A importância das ONG na promoção do Voluntariado. Estas organizações têm sido uma presença humanizadora nos países menos desenvolvidos. Mas surgem muitas críticas a estas ONG pelo facto de gastarem muito na sua manutenção, até pela grandeza que muitas delas atingiram. Talvez por isso a AMI procure gastar não mais de 15% do seu orçamento na sua própria manutenção. Mas o facto é que as ONG são frágeis: ou têm meios próprios ou correm sempre o risco de depender de quem as financia. O mundo não governamental e as ONG podem ser um mundo de oportunistas e um álibi para suprir aquilo que o Estado não faz e que muitas vezes devia fazer.
É por isso mesmo que só uma estrutura sólida e secular como a Igreja é capaz de manter voluntários (missionários) em continuidade ao longo de muitos anos.
As Igrejas devem assumir a mobilização das consciências, despertando-as para a necessidade de trabalhar pela transformação do mundo envolvente. É necessário congregar os espíritos de boa vontade e não agir em concorrência.
Põe-se também a questão do espírito crítico dos missionários. É verdade que esse deve ser o espírito característico dos missionários. Mas o que se verifica muitas vezes é que o missionário que critica é expulso ou morto. Daí a necessidade de se procurar encontrar a melhor forma de lidar com as situações, sem pôr em risco ou deitar a perder o trabalho de anos, porque o missionário expulso ou morto cessa aí a sua missão.
A tarde foi essencialmente preenchida pela apresentação das actividades que cada um desenvolve no âmbito da Justiça e Paz e da Animação Missionária.
O Pe. José Agostinho começou por relembrar o Recife, tendo falado resumidamente do que lá se passou e da preparação prévia que envolveu um pouco toda a Congregação.
A) PREPARAÇÃO. ESCOLHA DO TEMA
A escolha do tema “Economia e Reino de Deus” veio no seguimento de preocupações que já antes tinham surgido no Capítulo Geral: assistimos a uma globalização da economia e a uma cada vez mais crescente influência desta nas relações internacionais, em detrimento da política.
Era importante analisar este fenómeno crescente e ver as implicações que isso trazia à nossa vida de consagrados ao Senhor e discípulos do Pe. Dehon. Procurar entender as causas que levaram à presente situação, perceber os mecanismos por que se regem os diferentes sistemas
económicos, identificar as razões que levam a cavar-se um fosso cada vez maior entre um Norte rico e desenvolvido e um Sul crescentemente empobrecido e marginalizado serviram de ponto de partida para a reflexão e preparação do encontro de Recife.
Retomando as linhas orientadoras do Capítulo Geral, os reptos da Conferência Geral de Brusque e o trabalho de reflexão realizado pelos diferentes organismos da Congregação empenhados na causa da Justiça e Paz, partimos à procura de respostas.
B) A CONFERÊNCIA GERAL
A escolha do lugar para a realização da Conferência Geral não foi inocente: um encontro que ia abordar a actual situação da economia mundial era bom que decorresse em local que se visse de certa forma “vítima” desse fenómeno de crescente marginalização e empobrecimento. O Nordeste brasileiro é uma região com muitas dificuldades e, nesse, ressai a grande cidade de Recife. Além disso, Camaragibe, o lugar onde a Congregação entrou pela primeira vez no Brasil, ficava ali bem perto.
Partimos de um olhar atento pela realidade que nos envolve. Constatámos a globalização e a crise que afecta os principais modelos económico-políticos: o sistema socialista faliu e o sistema capitalista e neo-liberal não é resposta, tanto pelo materialismo e individualismo que o marcam como pelas injustiças e diferenças que não é capaz de evitar. Neste contexto, pareceu-nos fundamental o nosso testemunho profético, a necessidade de sermos solidários e efectivos na acção para transformar este estado de coisas.
De todas as reflexões e partilhas ficaram alguns desafios, traçaram-se algumas propostas de acção e identificaram-se algumas prioridades que passo a citar:
DESAFIOS À CONGREGAÇÃO
- Os bens ao serviço do bem comum e de todos.- PROPOSTAS DE ACÇÃO- A pessoa humana no centro de todas as atenções.
- Os pobres e o nosso voto de pobreza: partilha e solidariedade.
- Solidariedade no interior da Congregação: partilha de bens, pessoas, cultura e informação.
- Espiritualidade reparadora: acção, transformação, solidariedade.
- Identificar e atacar as causas da situação mundial actual.
- Testemunho de pobreza, nas estruturas, na partilha comunitária, inter-comunitária, inter-provincial e com os mais pobres.- PRIORIDADES- Potenciar a formação no campo do apostolado social, tanto a nível de especializações como na formação inicial e permanente.
- Criação em cada Província ou Região de um organismo de Justiça e Paz e dinamizar esta área da nossa formação e acção, levando-a também à comunidade humana.
- Trabalhar em parceria com outros organismos que promovam a Justiça e a Paz, o comércio solidário, o voluntariado. Com estes promover a dignidade da pessoa humana e combater todos os atentados aos mais elementares Direitos Humanos.
- Promover o laicado, nomeadamente na vertente do voluntariado. Animar os leigos, nomeadamente os jovens, a participar activamente na construção política, social e cultural da sociedade.
- Procurar investir eticamente os bens que nos são confiados.
- Promover ainda mais a partilha dentro da Congregação e desta com a sociedade. Criar em cada Província ou Região a “caixa da solidariedade” que possa ir ao encontro das maiores necessidades da sociedade envolvente.
- Preparação de especialistas no campo social em todas as Províncias e Regiões.O Pe. Cavagna, na qualidade de participante da mesma Conferência Geral e de membro do grupo que a preparou, relembrou que do Recife ficou uma reflexão geral acerca da necessidade de uma nova autoridade supra-nacional (nova ONU), que tenha de facto autoridade e a exerça com justiça e equidade. O mundo precisa de uma verdadeira autoridade política, que se imponha à autoridade económica.- Criação de um organismo de Justiça e Paz em cada uma das Províncias e Regiões.
- Continuar a apoiar o movimento para o perdão da dívida externe dos países mais pobres.
- Europa do Sul: Criar e manter uma ONG e associações semelhantes, como uma forma de apoio ao laicado e ao voluntariado.
O Pe. Carlos Alberto destacou a preocupação que tem tido o Conselho Geral em fazer que a Conferência do Recife não seja esquecida, que não fique apenas no papel, mas que tenha consequências concretas na vida de toda a Congregação.
O recente encontro de Superiores Provinciais e Regionais voltou a debruçar-se sobre o mesmo assunto e as suas implicações concretas na nossa vida.
O Pe. Cavagna apresentou uma breve reflexão acerca da espiritualidade social do Pe. Dehon. Está neste momento a ser de novo traduzida a obra do Pe. Dehon sobre temáticas sociais, contendo as suas conferências em Roma. A obra em causa chama-se “Renovação social cristã” e tem introdução do Pe. Perroux. Está também a ser traduzida para português.
O Pe. Adérito apresentou o trabalho que está a ser desenvolvido no âmbito do projecto dos Leigos Voluntários Dehonianos, seguindo o esquema da reflexão que recentemente fez no encontro de Animadores das Missões, que decorreu em Roma:
LEIGOS VOLUNTÁRIOS DEHONIANOS
1. ORIGEM
A Comissão Provincial de Pastoral Juvenil da Província Portuguesa desejava responder aos jovens que queriam fazer uma experiência de vida nas missões. Em 1999 foram a Moçambique verificar as condições para essa experiência e concluíram que um ou dois meses era pouco tempo para fazer uma experiência missionária.
2. LOCAL DA EXPERIÊNCIA
O Centro Polivalente do Gurué (Zambézia, Moçambique) era o único lugar que reunia condições para a experiência dos Leigos Dehonianos (jovens e adultos).
3. LEIGOS VOLUNTÁRIOS DEHONIANOS EM MOÇAMBIQUE
Primeiro Grupo: Julho 2000 a Dezembro 2000. 4 Leigos Voluntários Dehonianos. 6 meses.
Segundo Grupo: Fevereiro 2001 a Dezembro 2001. 2 Leigos Voluntários Dehonianos. 1 ano.
Terceiro Grupo: Agosto 2001 a Dezembro 2002. 4 Leigos Voluntários Dehonianos. Ano e meio.
Quarto Grupo: Janeiro 2002 a Dezembro 2002. 1 Leigo Voluntário Dehoniano. 1 ano.
Agosto 2002 a Agosto 2003. 1 Leigo Voluntário Dehoniano. 1 ano.
Previsões: 2003-2004 &endash; 7 Leigos Voluntários Dehonianos.
4. PREPARAÇÃO
4.1. Critérios
Preparar-se em grupo para intervir em grupo.
Mínimo de um ano em Moçambique. Máximo de dois anos.
Preparação de pelo menos um ano.
4.2. Programa
Participação nos encontros de espiritualidade dehoniana organizados pela Juventude Dehoniana, a partir das nossas pequenas publicações temáticas: Pe. Dehon, Oblação, Reparação, Disponibilidade, Eucaristia, Reconciliação, Missões.
Preparação mais específica. Encontros sobre o Gurué, com o objectivo de conhecer o nosso Centro Polivalente Leão Dehon e o tipo de população do Gurué.
Como subsídios específicos, utilizamos o precioso estudo do Pe. Egídio sobre os Leigos no tempo do Pe. Dehon e também o importante Instrumentum Laboris, preparado pelo Encontro da Família Dehoniana no ano 2000.
4.3. Subsídios feitos por nós
Os Estatutos, que já se encontram nas mãos do Superior Provincial para aprovação.
Temas preparados por nós: Igreja e Voluntariado; O Pe. Dehon e o Carisma; Viver e trabalhar em grupo; Igreja e Missões; Reparação; Adoração; Eucaristia.
5. OBJECTIVOS
Responder às necessidades locais.
Ensinar no Centro Polivalente Pe. Dehon.
Ajudar na promoção humana da população.
Evangelizar na comunidade cristã.
Fazer pastoral do carisma dehoniano.
6. ESTRATÉGIAS
Preparar leigos para a formação humana, religiosa e dehoniana.
Apoiar os moçambicanos com meios formativos: material didáctico e livros.
Cada vez que parte um grupo de leigos expedimos em média 600 kg de livros.
Temos recebido da Caritas ajuda económica para as viagens e para outros materiais didácticos.
7. INTERVENÇÃO PASTORAL EM TIMOR
Os dois bispos de Timor-leste convidaram-me, com mais dois dehonianos, dois médicos e uma professora universitária, para começar e acompanhar a Pastoral Juvenil e Familiar durante 4 anos.
8. SUGESTÕES
Sente-se a necessidade de um Documento de referência para os Leigos Dehonianos (Tipo Carta Constitutiva).
Inserção efectiva dos Leigos Dehonianos na Família Dehoniana.
Encontro a nível de toda a Congregação de quantos trabalham no voluntariado missionário dehoniano.
Os animadores missionários deveriam aproveitar a presença dos nossos missionários (em férias) para darem testemunho das suas experiências nas missões, falando nos seminários, paróquias e outras obras da Província. Assim se reforçará o espírito missionário de todos quantos nos escutam, como aconteceu comigo.
O Pe. Abel Maia falou-nos do trabalho de animação missionária que é levado a cabo na nossa Província.
Há os grupos de animação missionária, que funcionam em diferentes Paróquias e comunidades cristãs. Actualmente são 53, concentrados sobretudo no Norte do país, na Madeira e nos Açores. Os grupos têm por objectivos fundamentais: cultivar a oração, dar testemunho, viver a partilha, sensibilizar para a missão. O trabalho está sobretudo direccionado para Madagascar, embora ultimamente também se tenha voltado para Moçambique.
Os próprios Seminários têm grupos de animação missionária. Os boletins das diferentes casas também procuram sensibilizar para a causa missionária. Marcante em todo este trabalho é o Dia Mundial das Missões. Mas há também outros momentos fortes, como são os retiros que, na medida do possível, são orientados por missionários que estejam de passagem.
A Peregrinação Dehoniana a Fátima é outro grande momento deste movimento, já que uma boa parte das pessoas que nela participam pertencem a grupos missionários.
Fomentam-se semanas missionárias, promovidas sobretudo nas Paróquias abandonadas social ou religiosamente. Nestas semanas damos a conhecer a nossa espiritualidade. As exposições/feiras são também educação para a partilha.
A construção de um novo Centro de animação missionária (Betânia) vai sobretudo ao encontro das necessidades dos Grupos Missionários do Norte do país.
Publica-se a “Mensagem Missionária” no Norte e o “Entre Nós” na Madeira. São elos de ligação aos grupos missionários, levando-lhes sobretudo a mensagem dos nossos missionários, mas também a partilha de campanhas e iniciativas promovidas pelo sector da animação missionária da Província.
A promoção de férias missionárias é uma tentativa de envolver os jovens na evangelização e na sensibilização para a missão. Essas férias têm normalmente a duração de uma semana e são levadas a cabo nas Paróquias mais abandonadas.
O Pe. José Agostinho apresentou em traços gerais o trabalho que é desenvolvido na Obra ABC &endash; Amici Boni Consilii. É um lar residencial que acolhe 50 crianças/jovens em perigo social. Os utentes provêm de famílias destruídas ou com pouca capacidade para educar e acompanhar os jovens no seu crescimento. Muitas são famílias monoparentais e atingidas por graves problemas sociais e financeiros: droga, álcool, prostituição, desemprego, falta de habitação ou habitação degradada.
Os jovens chegam à Instituição através de pedidos dos Tribunais de Família e de Menores, dos serviços da Segurança Social, da Acção Social dos Municípios, das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens, de denúncias de vizinhos ou mesmo a pedido da própria família.
A Obra encontra-se em fase de expansão e de diversificação das suas actividades, procurando responder a outros desafios que a sociedade vai lançando. Foi apresentada uma candidatura a PIDDAC &endash; programa do Fundo Social Europeu &endash; com um projecto que visa abrir um centro de acolhimento para crianças a partir dos 0 anos de idade. Além disso, a Obra desenvolve actualmente diversos serviços de apoio social, alimentar e financeiro às populações mais carenciadas do meio envolvente, em colaboração com a Autarquia e outras entidades oficiais e privadas.
O Pe. Renzo Busana começou por se congratular com a melhor organização do trabalho de Justiça e Paz, consequência das reflexões feitas em Recife. Antes era um trabalho mais de carácter pessoal, que envolvia singularmente algumas pessoas. Excepção era o Villagio de Fianciulo. Também esta Obra passou por algumas transformações, sendo hoje um centro de acolhimento para jovens e adolescentes, em alternativa à prisão e acolhe também algumas famílias.
A Província tem também desenvolvido um notório trabalho de acolhimento de imigrantes, nomeadamente os provenientes da Europa de Leste. Para além destes diferentes trabalhos, é importante realçar o trabalho do Pe. Cavagna, que está a tempo inteiro para as questões de Justiça e Paz.
A Conferência do Recife não suscitou um grande trabalho de preparação na Província. Este ficou mais confiado ao Comité de Justiça e Paz. Este organismo viu a sua importância ainda mais reforçada após Recife, procurando transmitir à Província as reflexões e conclusões da Conferência. Este Comité procurou também lançar algumas propostas de acção concreta à Província: comércio solidário, investimento na Banca Ética, preocupação com o investimento dos recursos de cada comunidade, etc.
Recentemente o Conselho Provincial sugeriu a criação de uma secretaria autónoma, do género das existentes nas casas de formação, que visasse unicamente a recolha de fundos para o trabalho social. Talvez a solução passe pelo reencaminhamento de algumas secretarias de casas que em tempos foram seminários e que agora o não são.
O Pe. Carlos Alberto lembrou que a Congregação não tem uma Comissão Geral de Justiça e Paz, mas sim um Conselheiro que se encarrega dessa dimensão do nosso carisma e missão, o próprio Pe. Carlos. A nível dos Governos Gerais das Congregações foi criada uma Comissão de Justiça e Paz comum.
O Conselheiro Geral procura animar o trabalho de Justiça e Paz das diferentes Províncias e Regiões. Mas não lhe compete o trabalho de campo: esse é da responsabilidade dos respectivos Promotores e Comissões existentes.
O Pe. Cavagna partilhou connosco algumas das suas experiências mais recentes. Há pouco tempo foi enviado pelo Conselho Geral ao Congo/Zaire. Considerou muito importante ter ido em nome da própria Congregação, em vez de o ter feito a título pessoal.
Continua a trabalhar no projecto dos Objectores de Consciência, que visa trocar o serviço militar dos jovens pelo serviço cívico e de apoio à comunidade. Voltou a fazer jejum, em defesa da paz e da concórdia mundiais. O último fê-lo há poucos dias, tendo interrompido para poder vir a este Encontro. Defende a substituição dos exércitos por forças policiais, a substituição de gente que mata por gente que defende a vida.
Está a tentar promover a festa de S. Maximiliano, o Objector, discípulo de S. Cipriano, que dói morto por se ter recusado a combater e a matar. Não se pode continuar a falar de guerra justa, mas sim de uma polícia internacional, que promova a paz, sob a égide da ONU &endash; necessariamente renovada.
Tem consciência do impacto relativo de todas estas iniciativas, por se sentir parte de uma minoria, mesmo dentro da Igreja, onde muitas vezes é olhado com desconfiança e tido como extremista ou lunático.
No dia 4 partimos à procura de algumas conclusões que pudessem ficar deste nosso encontro.
O Conselho Geral insiste que a Conferência Geral do Recife não se fique pelo papel, mas se concretize na realidade de cada Província, frisou o Pe. Carlos Alberto. A preparação do Capítulo Geral, que começou na recente Reunião dos Superiores, vai em duas direcções: aprofundar o “Nós Congregação” e renovar a Congregação, com o regresso às fontes originais. Os Superiores procuraram analisar e partilhar a forma como está a ser posta em prática a Conferência de Recife, tanto a nível de zonas geográficas como de Províncias e de cada uma das comunidades.
Começámos a abordar a questão da preparação do próximo encontro de Promotores de Justiça e Paz da Congregação, que deverá acontecer em Montreal, Canadá, de 30 de Setembro a 10 de Outubro de 2002.
O referido encontro terá por objectivos fundamentais:
1. Rever Recife: como estão a ser concretizadas as reflexões e orientações que daí emanaram.Montreal será sobretudo um encontro de formação. Informações mais pormenorizadas começarão a surgir no nosso site da Internet e a ser directamente enviadas aos Promotores de Justiça e Paz.2. Aprofundar o estudo do fenómeno da globalização.
3. Analisar as situações de conflito latente, nomeadamente as que acontecem nas regiões e países onde de encontra a Congregação.
4. Dar formação aos Promotores de Justiça e Paz da Congregação.
5. Discutir a questão das ONG, tanto as que nos pertencem como aquelas com quem colaboramos ou podemos vir a colaborar.
6. Reflectir acerca da formação e sensibilização dos leigos para o trabalho de Justiça e Paz.
7. Debruçar-se sobre a problemática dos Meios de Comunicação Social: a sua importância no contexto da globalização, a forma como são usados por nós, os valores que eles veiculam.
Procurando dar o nosso contributo para Montreal, reunimo-nos em grupos linguísticos, respondendo a algumas questões preparatórias:
1. Como sensibilizar os scj à dimensão social?Eis, sucintamente, algumas das reflexões apresentadas pelos dois grupos:2. Que tipo de intervenção podem ter os scj em relação a uma maior justiça e à paz?
3. Que formação podemos e devemos dar aos leigos para que possam ser autênticos voluntários dehonianos ou apóstolos da dimensão social do P. Dehon?
4. Que formas podemos sugerir em ordem a uma confluência de esforços na Europa do Sul (exemplo ONG)?
1. Esta dimensão do nosso carisma deveria estar presente em toda a formação. Seria bom que os jovens religiosos fizessem uma experiência de trabalho em países do Terceiro Mundo durante o seu tempo de formação.
É fundamental sensibilizar todos e cada um dos confrades para as questões de Justiça e Paz, dando a conhecer mais o trabalho dos Promotores e das Comissões de Justiça e Paz.
2. Em primeiro lugar, devem ser defensores intransigentes da vida humana, superando também a ideia da guerra justa.
Promover a tolerância, o ecumenismo e o diálogo inter-religioso.
Sensibilizar as classes média/alta e as autoridades governamentais para a causa da Justiça e da Paz.
3. Colocar nas mãos dos leigos os nossos documentos, nomeadamente os escritos de cariz social do Pe. Dehon.
Promover Semanas e Férias Missionárias, tanto para jovens como para adultos.
Apostar na formação dos Leigos Dehonianos.
4. É necessária uma maior união de esforços a nível da Europa do Sul. Talvez se pudesse promover um encontro de leigos a nível da Europa do Sul para tratar estas questões de Justiça e Paz.
É importante a partilha e troca de experiências.
O plenário conclusivo serviu para troca de algumas impressões e também para discussão e aprovação do texto final, que nos propusemos enviar a todas as nossas comunidades e aos diferentes Promotores e Comissões de Justiça e Paz, como partilha do trabalho por nós desenvolvido ao longo destes dois dias.
O Pe. Isildo agradeceu o encontro, que viu como oportunidade para partilhar experiências e confrontar diferentes realidades. Na Justiça e Paz não há desempregados: todos somos chamados a sermos construtores de paz e promotores da justiça. Seremos fiéis a Jesus Cristo e ao Pe. Dehon na medida em que formos capazes de responder aos apelos do mundo actual.
O Pe. Carlos Alberto lamentou uma vez mais as ausências. Mas realçou de igual modo o trabalho desenvolvido, que muito contribuirá para sensibilizar todos os confrades para esta importante dimensão do nosso carisma. Haverá certamente sensibilidades diferentes na Congregação, mas é fundamental que a questão social esteja presente em todos os aspectos e dimensões da nossa vida: educação, formação, apostolado paroquial, trabalho missionário, oração.
Texto final
A 3 e 4 de Dezembro de 2001, no Seminário de Nossa Senhora de Fátima, em Alfragide, Portugal, reunimo-nos os Promotores de Justiça e Paz da Europa do Sul dos Sacerdotes do Coração de Jesus.
I. A REALIDADE
Com o dedicado contributo do Dr. Fernando Nobre, Fundador e Presidente da AMI (Assistência Médica Internacional), partimos de um olhar atento pela realidade crescentemente globalizada da nossa sociedade actual. Identificámos algumas realidades que simultaneamente nos preocupam e nos desafiam a renovar a nossa atitude e a nossa acção em favor das causas da Justiça e da Paz:
1 - A nossa sociedade vive profundamente o fenómeno da globalização a nível da economia, da comunicação, desacreditando a política e a pessoa humana. Esta globalização tende a cavar cada vez mais fundo o fosso que separa os ricos cada vez mais ricos dos pobres cada vez mais pobres.
2 - O poder hoje é exercido sobretudo pelos grandes grupos económico-financeiros, que não conhecem fronteiras nem barreiras na sua actividade.
3 - A Comunicação Social promove muitas vezes mais os interesses dos grandes grupos económico-financeiros do que a pessoa humana e a sua dignidade.
4 - Há graves focos de conflitos entre povos, civilizações e religiões, resultantes de um clima indiferença, de intolerância religiosa e cultural e, às vezes com traços de cinismo, que caracterizam as relações inter-culturais da comunidade mundial.
5- Não há nenhuma entidade supra-nacional que exerça uma autoridade firme, coerente e eficaz em todas as nações, dada a crise evidente e a dependência da ONU e outros organismos similares em relação aos Estados mais poderosos.
6 - Há uma significativa falta de valores e de referências políticas e culturais, que se reflectem no desmoronar das ideologias, na desagregação dos tecidos sociais e na destruição dos laços familiares.
II. PROPOSTAS
Não podemos ficar nem indiferentes nem inertes perante toda esta problemática. Na fidelidade ao carisma do nosso Fundador, Pe. Dehon, no seguimento das propostas de acção da Conferência Geral do Recife e na vontade de participar cada vez mais na construção de uma sociedade mais justa e mais humana, propomos:
1 - Aprofundar a dimensão social do nosso carisma, procurando que esta temática esteja presente em todo o nosso percurso formativo.
2 - Potenciar o trabalho de sensibilização e de consciencialização crítica dos promotores de Justiça e Paz e similares, procurando dar-lhes a formação necessária ao bom desempenho da sua missão.
3 - Defender intransigentemente o valor absoluto da vida humana, promovendo a dignidade de todos e cada um dos nossos irmãos, condenando todos os atentados que lhes são feitos: guerra, pena de morte, violência, tortura, exploração, terrorismo.
4 - Promover o ecumenismo e o diálogo inter-cultural, educando para a tolerância, para o respeito e para a colaboração com o outro que é, crê ou pensa diferente de nós.
5 - Pressionar a reforma dos movimentos e organismos internacionais (ONU), na busca de uma nova ordem mundial democrática.
6 - Sensibilizar os leigos e toda a sociedade civil para a cidadania, o dever de participar e voluntariamente se envolver na construção de uma sociedade mais justa, mais humana, mais evangélica.
7 - Verificar a possibilidade de concretização da prioridade escolhida pela Europa do Sul na Conferência Geral de Recife: "Criar e manter uma ONG e associações semelhantes, como uma forma de apoio ao laicado e ao voluntariado."
Acreditamos que, com a união e a participação activa e dinâmica da sociedade civil, podemos sonhar um futuro mais risonho, mais justo, humano, pacífico e evangélico.
Alfragide, 4 de Dezembro de 2001
Os participantes.