VIDA DA CONGREGAÇÃO

O ENCONTRO INTERNACIONAL DE FORMADORES

P. Francesco Mazzota (IM)

DE 10 a 21 de maio de 1999 houve, em Roma, o encontro internacional de Formadores da congregação. Cerca de 40 formadores, de vários níveis, estiveram presentes. O objetivo geral era o de confirmar a prioridade da formação em toda a congregação, e ao mesmo tempo pedia-se: 1) completar a Ratio Formationis Generalis (RFG) com elementos relativos à formação para a comunhão e para a internacionalidade; 2) elaborar um programa para o postulantado; 3) elaborar um plano de formação para os novos religiosos que preparam-se para os votos perpétuos; 4) redigir um itinerário pedagógico dehoniano para utilizar nas atividades pastorais dos jovens.

O eixo central do encontro foi a exposição feita pelo P. Amadeo Cencini sobre as mediações do formador. Ele elencou quatro elementos fundamentais. Não deve-se crer que as simples estruturas de formação formem os jovens. Estes elementos são necessários.

1. Um quadro de referência teórico-prático, isto é, um modelo, dentro do qual sejam estabelecidos os objetivos e métodos. É preciso dar muita atenção aos aspectos práticos. Temos, hoje, boas regras de vida nos Institutos religiosos, mas ratio fundamentalis não tanto boas. É importante estabelecer bem um programa de formação que não pode ser simplesmente teórico.

2. Uma rede de mediações pedagógicas: a pessoa do formador é a mediação princeps, a comunidade formadora, o ambiente, o contexto histórico-cultural.

3. Pluralidade convergente de dimensões e níveis. A formação é uma realidade complexa, constituída por vários níveis que devem estar presentes (vida de fé, carisma, integração entre a dimensão carismática e a de fé, a dimensão humana, a teologia que deve tornar-se mediação formadora; há, via de regra, uma distância grande entre a teologia que é ensinada nos cursos e a que vem a ser utilizada como mediação formadora).

4. Três dinamismos pedagógicos:

a) educar;

b) formar:

c) acompanhar.

Só existe formação se estes quatro elementos são colocados em prática.

A mediação do formador

O formador é apenas um mediador visto que o único formador é a Ssma. Trindade, do Pai que chama do nada do caos para a criação, do Filho que plasma no discípulo seus sentimentos e do Espírito Santo, que acompanha no discípulo o iter formativo do discípulo.

Ser mediador significa, então, que ele deve ter consciência de seu serviço. Ninguém deve sentir-se em condições de ser formador. O formador será sempre um instrumento inútil e limitado, dado que a mediação é por si mesma limitada. O conceito de perfeição é perigoso no papel de formador.

Se o formador é mediador do único formador divino, a formação é um processo de entrega nas mãos do formador para trilhar um caminho em direção de Deus.

É muito importante que o formador esclareça este seu papel, de imediato, junto ao formando a fim de que, na transparência e na clareza, a relação de formação possa ganhar consistência.

O formador/mediador não é um teórico que trabalha no foro interno, próprio do diretor espiritual. O formador, na lógica da tradição religiosa, é um cultivador direto, um camponês que trabalha a terra. Ele é chamado a se apresentar perante o candidato com uma presença que se define com estes três verbos:

a) educar;

b) formar;

c) acompanhar.

Os três dinamismos da formação

a) Educar - da sinceridade para a verdade

Educar significa tirar para fora, fazer emergir a verdade do eu, do sujeito. Sem fazer esta verdade aparecer não existe formação. No âmbito da formação deve-se ajudar o candidato a descobrir a verdade sobre si mesmo, penetrar dentro de si, a ir até à raiz de si mesmo.

Modelo e ícone deste dinamismo é o Pai que evoca o cosmos da criação a partir do nada do caos. O candidato deve ser, portanto, ajudado a sair de sua confusão. Só a partir deste momento começará a existir. Ele deve ser ajudado a entender o porque profundo de certos sentimentos, de certos modos de sentir. Caso contrário, a pessoa permanece distante de si mesma.

Um outro ícone deste dinamismo é o do Pai que educa seu povo, tirando-o da escravidão do Egito e, no deserto, lhe revela a verdade própria (“Eu o atrairei a mim, o conduzirei ao deserto e falarei ao seu coração” Os 2, 16).

A mediação educativa comporta uma série de dinâmicas:

- O educador deve conhecer a si mesmo para poder ajudar a outros. Ele deve ter alcançado a verdade sobre si mesmo e ter passado da fase da sinceridade (que é subjetiva e nela se expressa o que se sente) para a verdade (que é objetiva e implica o conhecimento do porque profundo de certas reações e sentimentos). Ele deve conhecer, sobretudo, as áreas fortes de si próprio bem como as áreas menos fortes e menos livres de sua personalidade.

- O educador deve reunir condições de discernir nos outros os conflitos e as imaturidades. Não pode contentar-se em observar o comportamento exterior. A educação, como conhecimento dos outros, deve passar por cinco degraus:

1. o comportamento externo observável;

2. as atitudes: estilos de comportamento, pré-disposição a reagir de certo modo;

3. os sentimentos, a vibração interior que movem as reações. O escopo da Vida Religiosa é o de formar em nós os sentimentos do Filho;

4. as motivações, as razões profundas que motivam seu agir;

5. o equívoco de fundo, o componente pagão que pode contaminar a finalidade das ações desde o início. No desejo de ser religioso, o candidato quer seguir Jesus mais de perto e pode, sem perceber, buscar um ideal de vida que o afirmará perante os outros. Ele pode buscar, em outras palavras, ao mesmo tempo, o Reino de Deus e seu reino. Não há nenhuma maldade ou patologia nisto. Se este dinamismo não vem a ser identificado, complica as coisas e acaba tomando conta. Não podemos controlar aquilo que desconhecemos acabamos nos submetendo. O educador deve estar ao lado para que isto não aconteça.

A educação é uma fase típica do postulantado. O educador não sabe apenas aplicar um método, mas leva o candidato à condição de fazer isto sozinho, a descobrir o equívoco de fundo que o motiva. O educador deve saber incutir uma metodologia de formação no candidato.

O educador deve dar ao candidato condições de saber resolver seus problemas, assumindo uma atitude livre e adulta, sempre menos dependente de sua imaturidade. Este deve ser um caminho progressivo, no qual o candidato vai aprendendo a rezar e a viver em sociedade.

b) Formar - da verdade para a liberdade

Formar quer dizer propor uma forma, entendida no sentido mais pleno e filosófico do termo: forma como um ideal. Num instituto religioso, esta forma não outra coisa senão o carisma. A forma que se pretende atribuir está contida no carisma, que abarca toda a vida. Esta forma o candidato deve ir assumindo progressivamente.

Não basta educar. Deve-se propor a verdade objetiva, ideal. Então a forma do carisma torna-se norma.

Na educação trabalha-se o eu atual, na formação, o eu ideal, aquilo que a pessoa é chamada a ser. O carisma é a forma que ele deve assumir, é o nome que Deus lhe deu e deve informar toda a sua humanidade. É preciso ajudar o candidato a entender que deve-se obediência a esta forma porque ela diz respeito ao projeto de Deus a seu respeito.

Se educar é um e-vocar, formar é pro-vocar, chamar alguém a ir além de si mesmo. Um autêntico caminho de formação não deixa de ser cansativo, uma cruz e uma conversão.

Formar é colocar, diante do candidato, alguma coisa que excede sua capacidade e que ele jamais escolheria espontaneamente. Deve verificar-se, então, uma mudança nele e isto será doloroso. Hoje, este aspecto está um tanto esquecido e a tendência geral é mitigar a dureza.

No processo formativo há um apelo a interiorizar o carisma e isto não acontece sem que uma parte do si morra. Deve-se exigir renúncias ao candidato deixando entrever o espaço de liberdade que se abre pela renúncia.

Formar é uma atividade primordial do Filho. O escopo da Vida Religiosa é o de ter os sentimentos do Filho. O formador é chamado a ser um mediador do Divino Formador, que é Jesus Cristo. A ação do formador humano levará o candidato a percorrer este duplo caminho:

a) a objetivação: o formador deve propor o carisma ao candidato à medida em que este for capaz de apresentar a verdade, a beleza e a bondade do objeto ideal que vem da forma do carisma, escondido nos sentimentos de Cristo. O formador deve ter a capacidade de apresentar de forma objetiva este ideal mostrando também sua beleza. Deve saber desvelar o próprio enamoramento por Jesus Cristo. Não pode fingir. Deve estar verdadeiramente enamorado para poder entusiasmar alguém. Não pode ser formador um consumidor de produtos alternativos aos que ele propõe. Igualmente não pode ser formador alguém que não seja capaz de partilhar a felicidade de pertencer a Deus, nem alguém que não transpareça alegria, por mais asceta e piedoso que possa ser.

b) a subjetivação, isto é, o contágio na ação. Este contágio só acontece quando consegue-se transmitir o ideal de modo que possa atingir o coração, a mente e a vontade do candidato.

A formação só acontece quando transmite-se a verdade do ideal que se quer propor de modo a penetrar a mente do candidato, sua beleza, de modo a mover seu coração, sua bondade, de modo a motivar sua vontade. Somente apresentando a totalidade objetiva se consegue a demover a totalidade subjetiva e não apenas uma parte dela. Somente um sujeito que aceita pôr em jogo a totalidade de suas dimensões subjetivas descobre a total realidade do objeto ideal.

Quando se estabelece uma boa correspondência entre verdade e intelecto pode-se chegar à contemplação; entre beleza e coração, chega-se ao enamoramento, que é o máximo grau da atividade cardíaca; entre bondade e vontade, pode-se chegar até ao martírio, que é o extremo da atividade volitiva de seguimento da bondade. Para que isto venha a acontecer, o enamoramento, por exemplo, não pode ser fruto apenas da atividade do coração, mas de toda a pessoa.

É importante que no caminho de formação não se multipliquem as experiências mas se criem disposições internas para que entrem em atividade os dinamismos acima descritos. O proprium da formação é fazer passar ao sujeito da verdade sobre si mesmo à realidade que o circunda e à liberdade.

Esta fase da formação poderia ser típica do noviciado.

c) Acompanhar

O formador é um irmão maior da fé o no discipulato que se coloca junto do formando como vizinho e irmão menor para partilhar com ele a estrada, para que descubra o desígnio que Deus lhe traçou e possa segui-lo em liberdade e responsabilidade plenas. O formador não é necessariamente um amigo, mas um companheiro que é chamado a partilhar com o irmão o elemento nutritivo essencial do caminho comum, o pão da fé, da realidade de Deus, do carisma religioso.

As condições para que isto possa acontecer são:

1. partilha de vida real e física. O formador é alguém que vive com o formando. A convivência é a melhor fonte de informação para conhecer o candidato;

2. as aptidões do formador para desempenhar seu papel;

3. a capacidade de partilhar.

O acompanhamento pode ser típico da fase pós-noviciado.

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Esta exposição ensejou muitos debates. No fim, um grupo de estudos, orientado pelo P. Wilson Jönck (BM) redigiu esboços de programas para as diversas fases de formação quais foram discutidos em plenário.

A formação para a comunhão e para a internacionaliade foi apreciada como positiva por todos.

Na conclusão do encontro o Superior geral mostrou sua satisfação com o andamento do mesmo. Disse que foi iniciado um processo que dará frutos mais tarde.

Durante o encontro foi dada muita importância ao postulantado. O Governo geral está convicto de que esta fase exerce um papel de fundamental importância no processo da formação. Dela depende quase 50% do sucesso de toda a formação porque o candidato chega ali cheio de motivação e de ideais. É o momento mais adequado para chegar ao coração. Quando certos problemas não são enfrentados durante o postulantado, as marcas ficarão pelo resto da vida.

O Superior geral agradeceu a todos os formadores presentes e lembrou-lhes que exercem uma missão importantíssima na Congregação. Desejou que este tipo de encontros seja sempre mais frequente, pelo menos entre os formadores da mesma área geográfica.